domingo, 27 de dezembro de 2009

OS VOTOS DE FELIZ ANO NOVO DE UM ESPÍRITA DE LEIPZIG

Um Espírita de Leipzig fez imprimir, em língua alemã, a correspondência seguinte da qual nos fazemos um prazer dar a tradução.

MEUS DESEJOS A TODO S OS ESPIRITAS E ESPIRITUALISTAS DE LEIPZIG, PELO ANO NOVO

A vós também, que vos chamais materialistas, porque não quereis conhecer senão a matéria, serei tentado de vos enviar meus desejos de felicidade, mas temo que não considerareis isto como um atrevimento de um estrangeiro que não tem o direito de contar-se entre vós.

Ocorre de outro modo com Espiritualistas, que estão sobre o mesmo terreno que os Espíritas no que toca à convicção da imortalidade da alma, de sua individualidade e de seu estado feliz ou infeliz depois da morte. Os Espiritualistas e os Espíritas reconhecem em cada homem uma alma irmã da sua, e por isso me dão o direito de lhes enviar meus votos. Uns e outros agradecem o Senhor pelo ano que vem de se escoar, e esperam que, sustentados por sua graça, terão a coragem de suportar as provas dos dias infelizes, à força de trabalhar em seu aperfeiçoamento, domando suas paixões.

A vós, caros Espíritas, irmãos e irmãs conhecidos e desconhecidos, eu vos desejo particularmente um ano feliz, porque recebestes de Deus, para vossa peregrinação terrestre, um grande apoio no Espiritismo. A religião veio trazer a todos a f é e bem felizes aqueles que a conservaram. Infelizmente, ela está extinta num grande número; é porque Deus envia uma nova arma para combatera incredulidade, o orgulho e o egoísmo que tomam proporções cada vez maiores. Esta arma nova é a comunicação com os Espíritos; por ela temos a fé, porque nos dá a certeza da vida da alma, e nos permite lançar um golpe de vista na outra vida; reconhecemos assim a vaidade da felicidade terrestre, e temos a solução das dificuldades que nos fazem duvidar de tudo, mesmo da existência de Deus.

Jesus disse a seus discípulos: "Teria ainda muitas coisas a vos dizer, mas não poderíeis ainda suportá-las." Hoje, tendo a Humanidade progredido, pode compreendêlas; foi porque Deus nos deu a ciência do Espiritismo, e a prova de que a Humanidade está madura para esta ciência, é que esta ciência existe. É inútil negar e zombar, como outrora foi inútil negar e zombar dos fatos adiantados por Copérnico e Galileu. Então esses fatos eram tão pouco reconhecidos quanto o são agora os do mundo dos Espíritos. Como outrora, os primeiros opositores são os sábios, até o dia em que, vendo-se isolados, reconhecerão humildemente que as novas descobertas, como o vapor, a
eletricidade e o magnetismo, que outrora eram desconhecidos, não são a última palavra das leis da Natureza. Eles serão responsáveis, diante das gerações futuras, por não terem acolhido a ciência nova como a irmã da outras, e de tê-la repelido como uma loucura.

É verdade que ela não ensina nada de novo proclamando a vida da alma, uma vez que o Cristo disto falou; mas o Espiritismo levanta todas as dúvidas e lança uma nova luz sobre esta questão. Guardemo-nos, no entanto, de considerar como inúteis os ensinamentos do cristianismo e de crê-los substituídos pelo Espiritismo; fortaleçamo-nos, ao contrário, na fonte das verdades cristãs, para as quais o Espiritismo não é senão uma nova bandeira, a fim de que nossa inteligência e nosso orgulho não nos desviem. O Espiritismo nos ensina, antes de qualquer coisa, que: "Sem o amor e a caridade, não há felicidade", quer dizer que é preciso amar seu próximo como a si mesmo; apoiando-se sobre esta verdade cristã, abre o caminho para o cumprimento desta palavra do Cristo: "Um só rebanho e um só pastor."

Assim, pois, caros irmãos e irmãs espíritas, permiti-me que aos meus votos para o ano novo eu acrescente ainda este pedido: que não medireis jamais o poder de se comunicar com o mundo espiritual. Não nos esqueçamos de que, segundo a lei sobre a qual repousam nossas relações com os Espíritos, os maus não são excluídos das comunicações. Se é difícil constatar a identidade de um Espírito que não conhecemos, é fácil distinguir os bons dos maus. Estes podem se esconder sob a máscara da hipocrisia, mas um bom Espírita os reconhece sempre; é porque não é preciso se ocupar dessas coisas levianamente, porque pode-se tornar-se o joguete de Espíritos maus, embora inteligentes, como são encontrados, às vezes, no mundo dos encarnados. Se compararmos nossas comunicações com aquelas que são obtidas nas reuniões de Espíritas fervorosos e sinceros, saberemos logo reconhecer se estamos no bom caminho. Os Espíritos elevados se fazem reconhecer pela sua linguagem, que é por toda parte a mesma, sempre de acordo com o Evangelho e a razão humana.

O meio de se preservar dos maus Espíritos é, primeiro, fazer uma prece sincera a Deus; segundo, não empregar jamais o Espiritismo para as coisas materiais. Os maus Espíritos estão sempre prontos a satisfazer a todos os pedidos, e se, às vezes, dizem coisas justas, o mais freqüentemente, enganam com intenção ou por ignorância, porque os Espíritos inferiores não sabem mais do que durante sua existência terrestre. Os bons Espíritos nos ajudam, ao contrário, em nossos esforços para nos melhorar, e nos fazem conhecer a vida espiritual, a fim de que possamos assimilá-la à nossa. Tal é objetivo para o qual devem tender todos os Espíritas sinceros.

Adolf, conde PONINSKI.
Leipzig, 1°de janeiro de 1868.


Revista Espírita, 1868, Allan Kardec

sábado, 12 de dezembro de 2009

EM CASA NOUTRO PLANETA

Hoje é sábado, meu sinal de internet continua horrível como sempre, resolvi me dedicar aos livros, porém não à leitura mas a organização. Arrumando uns, ajeitando outros, registrando novos no cadastro da minha pequena biblioteca pessoal e cadastrando outros no site www.trocandolivros.com.br , quando folhei um livro que um amigo pediu para cadastrar no site: O Paraíso é uma Questão Pessoal.

Do mesmo autor de Fernão Capelo Gaivota, fiquei relembrando cenas do filme maravilhoso e que fornece lindos ensinamentos espíritas, lembrei que meu amigo já havia dito que este livro era meu e o tinha emprestado e eu dizia que não, isto ocorreu umas quatro vezes e esta lembrança me fez sorrir com carinho.

O livro é composto por pequenas crônicas e o título de uma me chamou a atenção: Em Casa Noutro Planeta. Sendo este, assunto de minhas pesquisas atuais, resolvi ler e ao final sorri de certa forma agradecida e resolvi partilhá-lo com meus amigos. Vou colocar a crônica na íntegra e em azul abaixo, boa leitura.

Em Casa Noutro Planeta (1969)

“Eu tinha acabado de subir no ClipWing e de praticar uma pequena seqüência: loop seguido de tonneau, seguido de parafuso, seguido de immelmann, só por prazer. Estava satisfeito, nesse dia, de ter conseguido fazer um bom immelmann. Não é fácil de fazer mas, após algum tempo, a gente tem prazer em conseguir fazer uma manobra tão espetacular. Antigamente, as pessoas que viam os meus immelmanns, diziam:- Puxa, que horrível tonneau! – Tinha que explicar que a Força Aérea não ensinava a fazer nenhuma manobra de gravidade negativa, de modo que eu tive de aprende-las por minha conta e, como a minha capacidade de aprender diminui sem um instrutor de má catadura sentado atrás de mim, até que é uma grande coisa pôr o avião outra vez de barriga para baixo, quando é chegada a hora de aterrisar.

Terminei aquela seqüência bastante razoável com um regular immelmann, voei mais um pouco, olhando para fora da cabine para as pessoas trabalhando, na escola, ou dirigindo automóveis de folha de lata, ao longo de estradas atravancadas. Depois, a aterrissagem e num momento o motor estava tão quieto como cinquênta minutos antes; um término normal para um vôo normal. Saí do avião, trouxe o manche para trás, amarrei os cabos dos montantes e da cauda, travei o leme de direção.

Mas aí, bem no meio de toda essa normalidade cotidiana, tive, de repente, a mais estranha das sensações. O avião, a luz do sol, a grama, os hangares, as árvores verdes, o leme nas minhas mãos, o chão sob meus pés... tudo me era estranho, distante.

Esse não é o meu planeta. Esta não é a minha terra.

Foi um dos momentos mais horríveis da minha vida, o que aconteceu quando as minhas mãos largaram o leme de direção.

Este mundo parece estranho porque ele é estranho. Estou aqui há pouco tempo apenas. Minhas recordações secretas são de outros tempos e de outros mundos.

Que estranha maneira de pensar, disse comigo mesmo, vamos sair dessa, meu filho. Mas quem diz que eu conseguia? Na verdade, recordava pedaços dessa sensação, fragmentos dela após cada vôo que eu fazia - a estranha sensação de voltar para a terra, a convicção profunda de que este planeta, para mim, pode significar férias, escola, aprendizado ou teste, mas nunca a minha terra.

Venho de outro lugar e para ele voltarei um dia.

Era tão absorvente, essa sensação, que me esqueci de verificar os pneus, antes de partir e praguejei contra mim mesmo, da próxima vez em que voei. O imbecil que se esquece de verificar os seus pneus, que é que pode esperar dele?

Mas essa mesma sensação me tem perseguido repetidas vezes desde aquele vôo no Cub. Não sei a que atribuí-la nem como explicá-la, exceto que talvez seja verdade. E, se for verdade, se estamos todos passando por este planeta para adquirir experiência ou aprendizado, que significa isso?

Se for verdade, provavelmente significa que não devemos nos preocupar. provavelmente significa que eu posso pegar nas coisas com que tão solenemente me preocupo, nesta vida, e olhar para elas como se fosse um visitante do planeta, dizendo, ora eu não tenho nada a ver com elas. Para mim, isso faz diferença.

Não achei que fosse o único visitante a quem tivesse ocorrido, leme na mão ou no meio de um immelmann, a mesma sensação. Sabia que todo aquele que voa pode ter sentido, de vez em quando, a mesma estranheza num mundo que, sob todos os pontos de vista da lógica, deveria ser familiar como um lar.

E estava certo. Por que um dia, após um vôo em formação sobre nuvens de verão, uma beleza de vista, um amigo me disse quase a mesma coisa.

-Toda essa conversa de se lançar no espaço - há ocasiões, como agora, em que eu sinto que estou voltando. Estranho, sabe, como se eu fosse um venusiano ou algo parecido. Entende o que quero dizer? Alguma vez lhe aconteceu? Já pensou nisso?

-Talvez. Ás vezes. Sim, já pensei nisso. - Quer dizer que eu não estou louco, pensei. Não sou só eu.

Cada vez acontece mais comigo e devo confessar que não é desagradável ter raízes noutro tempo.

Gostaria de saber como é voar, na minha terra.”

“este planeta, para mim, pode significar férias, escola, aprendizado ou teste, mas nunca a minha terra” esta frase me chamou muito a atenção pois ela demosntra que nós nos consideramos muito mais humanos que espíritos, acreditamos profundamente que somos terráqueos, quando na verdade somos universais, porque somos espíritos.

ClaudiaC.

domingo, 4 de outubro de 2009

Me ajudem na minha pesquisa...

Olá amigos

Meu nome é Claudia e estou fazendo uma pesquisa sobre o medo e gostaria de convidar vocês para responderem a um formulário bem simples.
Não precisa de identificar, cadastrar, nada, apenas ser honesto e responder o formulário.


A pesquisa foi finalizada e agradeço a todos que quiseram participar, em breve postarei o resultado e a análise.

Uma abraço
Claudia

sábado, 12 de setembro de 2009

O Tempo e o Espaço no Mundo Espiritual

O Tempo

Buscando o conceito geral da palavra tempo, encontrada no Dicionário Aurélio, podemos dizer que tempo é uma sucessão de anos, dias e horas e que envolvem a noção de presente, passado e futuro.

Mas o tempo não é algo material, não é físico, apesar de se basear em convensões físicas. Se a teoria da relatividade a duração de um evento é relativa ao referencial inercial em que se encontra o observador, por exemplo se o indivíduo está em movimento em relação a um evento, a duração deste evento será diferente de outro indivíduo que o observa parado.

Além disto a percepção de duração é relativa também ao estado do observador. Fisiologicamente, a incerteza de um julgamento temporal aumenta com a duração do intervalo julgado. Isto parece ter origem na lei de Weber (proposta por Ernst Weber, em 1831), segundo o qual para percebermos que um dado estímulo sensorial sofreu variação, o acréscimo (ou decréscimo) mínimo necessário deve ser proporcional à magnitude inicial do estímulo original.

Todos nós também já experimentamos a sensação de o tempo "voar", quando estamos em lugares ou situações agradáveis, ou de se "arrastar", nos momentos em que esperamos com ansiedade algo acontecer. Novamente, parece ser a atenção que prestamos à sucessão de eventos em curso o fator determinante de nossa experiência temporal. Vários estudos demonstram que a duração de um estímulo sensorial, tal como percebida por um observador, é fortemente influenciada pela atenção que ele dispensa ao estímulo.

Se no mundo espiritual o pensamento é tudo, como dizem, a noção de tempo é semelhante e amplificada, pois a duração de um evento espiritual é influenciada pela atenção dispensada ao evento.

Para Kardec no livro A Gênese, o tempo não é senão a relação das coisas transitórias, e portanto, unicamente de coisas que se medem, é uma medida relativa da sucessão das coisas transitórias; já a eternidade, do ponto de vista de sua duração, não pode ser medida, não tem começo nem fim, tudo é o presente.

Se formos assistir ao filme onde um homem nasce com um corpo que convencionamos chamar de velho e morre com ele novo, sabemos que o tempo está invertido. Isto ocorre porque ligamos a imagem do corpo ao tempo percorrido. Muitas pessoas tem uma surpreendente noção do tempo percorrido quando se olham no espelho.

Quando Kardec diz, no item 14 do Código Penal da Vida Futura, do livro O Céu e o Inferno, que a duração de um castigo que está subordinado ao melhoramento do espírito, diz que aquele que não melhora, não se arrepende continua sofrendo sempre e seu castigo lhe parece eterno. Como no mundo espiritual não existe uma sequência de eventos que possa ser medida, o espírito que sofre mantém toda a sua atenção voltada ao seu sofrimento e tem a percepção de que o tempo parou e nunca terá fim. Se considerarmos que no mundo espiritual tudo depende da capacidade evolutiva do espírito, a percepção da eternidade das penas é maior nos espíritos inferiores e menor nos espíritos superiores.

Muitas vezes vemos em reuniões mediúnicas espíritos que acreditam estar ainda naquele tempo em que viviam encarnados, porque a sua atenção e seu pensamento mantém uma imagem quase estática no sentido temporal e isto faz com que o indivíduo acredite estar vivo, pois seu aparente corpo não envelhece, as lembranças de que recorda são sempre as mesmas.

O Espaço

De acordo com o Dicionário Aurélio o espaço é a distância entre dois pontos; área ou volume entre limites determinados. Lugar mais ou menos bem definido, que pode ser ocupado por algo ou alguém. Se compreendemos o mundo espiritual eterno e infinito, o compreendemos sem começo nem fim.

Mas e o espaço dentro deste infinito? Pode ser medido, utilizado, criado e destruído? Se considerarmos o Universo como um todo o espaço passível de ser ponderado seria o físico e material, os planetas, estrelas, cometas etc.

O Espírito errante, ou seja, aquele que habita o mundo espiritual não se encontra num espaço delimitado. Porém como afirmam os Espíritos na questão 234 do O Livro dos Espíritos: "Há mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que eles podem habitar temporariamente, espécies de acampamentos, de lugares em que possam repousar de erraticidades muito longas, que são sempre um pouco penosas. São posições intermediárias entre os mundos, graduadas de acordo com a natureza dos Espíritos que podem atingi-las e que nelas gozam de maior ou menor bem-estar."

Então poderíamos dizer que por fim existem os conhecidos Vales de sofrimento, como o vale dos suicidas e até as colônias espirituais como o Nosso Lar entre outras? Sim, se os considerarmos físicos e não espirituais. Isto é explicado na questão 236, onde os Espíritos nos dão as características destes mundos: Não são habitados por seres corpóreos e sua superfície é temporariamente estéril, assim como a Terra já foi durante a sua formação. Esta descrição deixa claro que os mundos transitórios são mundos materiais no qual os espíritos afins se encontram.

Não poderíamos compreender estes vales como a descrição de mundos transitórios habitados espiritualmente por espíritos simpáticos pelo mal ou pela dor? Mesmo quando um espírito desencarnados nos descreve estes locais, vales ou colônias, como próximos à Terra, esta proximidade seria a relação entre tempo e espaço, e sendo a transmissão de pensamento quase imediata e estando o espírito onde está seu pensamento, talvez ainda não possamos compreender a amplitude que pode ter este conceito de proximidade.

Claudia C.

Obras básicas de Allan Kardec

Máscaras do Tempo. artigo publicado na Revista Scientific American Brasil, edição nº 50, de julho de 2006, de Marcus Vinícius C. Baldo, André M. Cravo e Hamilton Haddad Jr.

sábado, 5 de setembro de 2009

SOU RELIGIOSO

 Rubem Alves

Eu sou muito religioso. Por isso trato cuidadosamente de evitar igrejas e cerimônias religiosas: para que meus sentimentos religiosos não sejam perturbados. Minhas experiências passadas com igrejas não têm sido boas. Sempre que vou a igrejas ou participo de cerimônias religiosas minha alma fica irritada. Os porta-vozes de Deus sempre falam demais. Parecem gostar do som da sua voz. Gostaria de uma igreja onde não houvesse sermões: só silêncio, música e poesia. Houve exceções de que não me esqueço. Uma missa na catedral de Cuernavaca, México. Se houve homilia eu nem me lembro.

Lembro-me da dança  todo mundo dançando, ao ritmo da música dos mariachis. Foi alegria pura. Lembro-me também de uma semana que passei num mosteiro da Suíça onde se cultivava o silêncio. Três vezes ao dia, às seis da manhã, ao meio-dia e às seis da tarde havia uma meia hora litúrgica onde nada era dito. Apenas o silêncio, as velas, a contemplação dos ícones de Cristo. Foi beleza. Deve ter havido outras ocasiões. Mas não estou me lembrando delas no momento.

Quando me perguntam eu deveria dizer que não sou religioso. Dizendo-me religioso os outros logo pensam que sou adepto de alguma religião. Eles imaginam que as religiões e as igrejas são semelhantes aos supermercados, lugares onde a gente vai se abastecer de mercadorias sagradas. Para eles, ter sentimentos religiosos sem freqüentar igrejas ou pertencer a religiões seria o mesmo que dizer que me abasteço de verduras, frutas, legumes, carnes, leite, cereais sem fazer compras.

Daí não entenderem que eu possa ter sentimentos religiosos sem freqüentar igrejas. De fato, eu não pertenço a grupo religioso algum. Meus sentimentos nada têm a ver com igrejas e rituais religiosos. Talvez eu devesse simplesmente dizer que sou místico sem religião. Se os religiosos disserem que isso não é possível, que é preciso ter uma religião, eu lhes direi que não há indicações de que Deus tenha concordado em se tornar numa mercadoria a ser distribuída com exclusividade pelos seus supermercados religiosos. Deus é livre como o Vento  pelo menos foi isso que Jesus disse. Claro que há religiões que dizem que o Vento só pode ser obtido engarrafado. Elas se acreditam como distribuidoras de Vento engarrafado. Uma religião que afirme que o sagrado é um monopólio seu está dizendo que ela conseguiu engarrafar o Vento, que ela conseguiu por o Vento sob seu controle. E isso é idolatria. Os teólogos medievais sabiam que o finito não pode conter o infinito.

A minha experiência com o sagrado vem sempre fora de lugares religiosos, diante do mistério da noite estrelada, de uma teia de aranha, de uma árvore florida, da ternura do amor, do riso de uma criança, da frescura dos riachos, da graça do vôo dos urubus, da alegria do cachorro que me recebe. Essas coisas que me dão alegria e que, por isso mesmo, são para mim sagradas, eu nunca as encontrei nas igrejas. Sagrado, para mim, é aquilo que meu coração deseja que seja eterno. O sagrado é a realização do amor. Meu misticismo, assim, nada me diz sobre seres de um outro mundo. Ele não me informa sobre deuses, céus, infernos, pecados, demônios e anjos. Meu misticismo não aumenta o meu conhecimento sobre o universo. Meu misticismo não é um substituto para a ciência.

Meu misticismo, também, não me dá conselhos morais. Não ordena que eu seja bom. Não me manda ajudar os pobres. Não me manda lutar pela justiça. Não é preciso ser místico para ser bom, para amar os pobres, para lutar pela justiça. Acho vergonhoso ser bom, amar os pobres e lutar pela justiça porque Jesus manda. Então é porque ele manda? Se não mandasse a gente não faria? Se Deus não mandasse e não ameaçasse não seríamos bons? Se assim é, então somos bons, amamos os pobres e lutamos pela justiça porque temos medo. Mas tudo o que brota do medo é o oposto do sagrado. O amor lança fora o medo.

Meu misticismo nem me dá conhecimentos de um outro mundo e nem me dá ordens morais. Ele é um sentimento  ou como se fosse uma música que ouço dentro de mim. Schleiermacher, um teólogo romântico do fim do século 18, dizia que o sentimento religioso é o sentimento de "dependência absoluta" diante do universo. Eu não existo em mim mesmo. Eu existo somente em relação a uma coisa enorme, gigantesca, fantástica, coisa que não compreendo, mas que me envolve, na qual eu nasço e para a qual voltarei um dia.

Sou uma nota numa sinfonia com milhares de notas, uma folha num jequitibá com milhares de folhas, uma única gota num mar com gotas sem fim. De um lado eu me descubro infinitamente pequeno. De outro lado eu me descubro imensamente grande: estou ligado tudo. Sou tão grande quanto o universo, que se transforma então no meu grande corpo.

Alguns dão o nome de Deus a esse Grande Corpo no qual todas as coisas existem. Gosto dessa idéia. Aconteceu faz muito tempo, quando ouvir o rádio exigia paciência e atenção. Havia a barulheira constante da eletricidade estática que era ouvida ora como pipocas estourando numa panela, ora como uma série de intermináveis assobios. Eu me lembro. Era noite. Já estava na cama. Luz apagada. Gostava de dormir com música. Rádio Ministério da Educação: havia sempre músicas do meu gosto. De repente, no meio dos estouros e assobios da estática, uma música linda que mal se podia ouvir. Mas, em meio aos ruídos sem sentido da estática, o meu ouvido percebia a beleza que mal se ouvia, perdida no meio da estática.

Aí eu pensei que o sentimento religioso é assim mesmo: em meio à barulheira da vida, a gente ouve uma melodia. Há um lindo texto de Nietzsche em que ele descreve precisamente essa experiência  ele fala de uma melodia de beleza indescritível que repentinamente começou a ouvir dentro da sua alma, beleza tão grande que ele começou a chorar. Nietzsche era uma dessas pessoas possuídas por um profundo sentimento místico e que, precisamente por causa dele, tinha de ficar longe de todas as religiões. As igrejas o horrorizavam.

Dizia que elas mais se pareciam com sepulcros de Deus. E tinha horror das músicas que ali se cantavam, que ele comparava ao coro de rãs dentro de um charco. Sim. Sou religioso. O universo é o meu templo. O ruído dos regatos, o barulho do vento nas folhas dos eucaliptos, o perfume do jasmim, as cores do crepúsculo, as experiências de arte e de brinquedo são, todos, para mim, sacramentos  fugazes experiências do sagrado. Deus nunca foi visto por ninguém. Mas sempre que tenho uma efêmera experiência de beleza e da amor é como se eu tivesse visto, num breve segundo, uma cintilação do sagrado.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

NOTÍCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LUMEN

Relato de outra Terra

Por Camille Flammarion, professor de astronomia, ligado ao observatório de Paris. Este não é um livro, mas um artigo que poderia fazer um livro interessante e sobretudo instrutivo, porque seus dados são fornecidos pela ciência positiva, e tratados com a clareza e a elegância que o jovem sábio traz em todos os seus escritos. O Sr. Camille Flammarion é conhecido de todos os nossos leitores por sua excelente obra
sobre a Pluralidade dos mundos habitados, e pelos artigos científicos que publica no Siècle. Aquele do qual vamos dar conta foi publicado na Revue du XÍXo século, de 1o de fevereiro de 1867 (1-(1) Cada número forma um volume de 160 páginas grandes in-8. Preço 2 fr. Paris, livraria internacional, 15, bulevard Montmartre, e 18, avenida Montaigne, palais Pompéien.).
O autor supõe uma conversa entre um indivíduo vivo chamado Sitiens, e o Espírito de um de seus amigos chamado Lumen, que lhe descreve seus últimos pensamentos terrestres, as primeiras sensações da vida espiritual, e as que acompanham o fenômeno da separação. Esse quadro é de uma conformidade perfeita com o que os Espíritos nos ensinaram a esse respeito; é o Espiritismo mais exato, menos a palavra que não é pronunciada. Será julgado pelas citações seguintes:


"A primeira sensação de identidade que se sente depois da morte parece aquela que se sente ao despertar durante a vida, quando, retornando pouco a pouco à consciência da manhã, se está ainda atravessado pelas visões da noite. Solicitado pelo futuro e pelo
passado, o Espírito procura, ao mesmo tempo, retomar plena posse de si mesmo e agarraras impressões fugidias do sonho desvanecido, que passam ainda nele com o seu cortejo de quadros e de acontecimentos. Por vezes, absorvido por essa retrospecção de
um sonho cativante, sente sob a pálpebra que se fecha, as urdiduras da visão se renovarem, e o espetáculo continuar; ao mesmo tempo, ele cai no sonho e numa espécie de sonolência. Assim balança a nossa faculdade pensante ao sair desta vida, entra uma
realidade que ela ainda não compreende, e um sonho que não está completamente desaparecido."

Nota. Nesta situação do Espírito, não há nada de espantoso em que alguns não creiam estar mortos. "A morte não existe. O fato que designais sob este nome, a separação do corpo e da alma, não se efetua, verdadeiramente dizendo, sob uma forma material comparável às separações químicas dos elementos dissociados que se observam no mundo físico. Não se percebe mais dessa separação definitiva, que nos parece tão cruel do que a criança recém-nascida não se percebe de seu nascimento; somos nascidos na vida futura como o
fomos na vida terrestre. Unicamente, não estando mais envolvida das faixas corpóreas que a revestem neste mundo, adquire mais prontamente a noção de seu estado e de sua personalidade. Esta faculdade de percepção varia. no entanto, de uma alma a outra. Há
as que, durante a vida do corpo, não se elevaram jamais para o céu e jamais se sentiram ansiosas em penetrar as leis da criação. Aquelas, ainda dominadas pelos apetites corpóreos, permanecem por muito tempo no estado de perturbação inconsciente. Há outras delas, felizmente, que, desde esta vida, voam sobre suas aspirações aladas para os cimos do belo eterno; aquelas vêem chegar com calma e serenidade o instante da separação; elas sabem que o progresso é a lei da existência e que entrarão, no além, numa vida superior àquela sua daqui; seguem passo a passo a letargia que prepara o seu coração, que quando o último batimento, lento e insensível, o detém em seu curso, elas já estão acima de seu corpo, do qual observaram o adormecimento, e, livrando-se dos laços magnéticos, elas se sentem rapidamente levadas, por uma força desconhecida, para o ponto da criação onde suas aspirações, seus sentimentos, suas esperanças, as atraem.

"Os anos, os dias e as horas são constituídos pelos movimentos da Terra. Fora destes movimentos o tempo terrestre não existe mais no espaço; é, pois, absolutamente impossível ter noção desse tempo."

Nota. - Isto é rigorosamente verdadeiro; também quando os Espíritos querem nos especificar uma duração inteligível para nós, são obrigados a se identificarem de novo com os hábitos terrestres, de se refazerem homens, por assim dizer, a fim de se servir dos mesmos pontos de comparação. Logo depois de sua libertação, o Espírito de Lumen é transportado com a rapidez do pensamento para o grupo de mundos compondo o sistema de estrelas designado em astronomia sob o nome de Capellaou a Chèvre. A teoria que dá da visão da alma é notável.

"A visão de minha alma era de um poder incomparavelmente superior àquela dos olhos do organismo terrestre que eu vinha de deixar; e, observação surpreendente, seu poder me parecia submetido à vontade. Que me baste vos fazer pressentir que, em lugar de ver simplesmente as estrelas no céu, como as vedes na Terra, eu distinguia claramente os mundos que gravitam em torno; quando desejava não mais vera estrela, a fim de não estar mais torturado pelo exame desses mundos, ela desaparecia de minha visão, e me deixava em excelentes condições para observar um desses mundos. Além disto, quando minha visão se concentrava sobre um mundo particular, chegava a distinguires detalhes de sua superfície, os continentes e os mares, as nuvens e os rios.

Por uma intensidade particular de concentração na visão da minha alma, chegava a ver o objeto sobre o qual ela se concentrava, como, por exemplo, uma cidade, um campo, os edifícios, as ruas, as casas, as árvores, as veredas; reconhecia mesmo os habitantes e seguia as pessoas nas ruas e nas habitações. Bastava-me para isto limitar meu pensamento ao quarteirão, à casa, ou ao indivíduo que eu queria observar. No mundo a margem do qual acabava de chegar, os seres, não encarnados num envoltório grosseiro como o deste mundo, mas, livres e dotados de faculdades de percepções elevada a um eminente grau de poder, podem perceber distintamente os detalhes que, nessa distância, estariam absolutamente ocultos às organizações terrestres.
SITIENS. É que se servem para isso de instrumentos superiores aos nossos telescópios?

LUMEN. Se, por ser menos rebelde à admissão desta maravilhosa faculdade, vos é mais fácil concebê-los munidos de instrumentos, vós o podeis por teoria. Mas devo vos advertir que essas espécies de instrumentos não são exteriores a esses seres, e que pertencem ao próprio organismo da visão. É bem entendido que essa construção ótica e esse poder de visão são naturais nesses mundos, e não sobrenaturais. Pensai um pouco nos insetos que gozam da propriedade de encurtar ou de alongar seus olhos, como os tubos de uma luneta, de inchar ou achatar seu cristalino para dele fazer uma lupa de diferentes graus, ou ainda de concentrar ao mesmo foco uma multidão de olhos apontados como tantos microscópios para agarrar o infinitamente pequeno, e podereis mais legitimamente admitir a faculdade desses seres ultra terrestres."

O mundo em que se encontra Lumen está a uma distância tal da Terra que a luz não chega de um ao outro senão ao cabo de setenta e dois anos. Ora, nascido em 1793 e morto em 1864, na sua chagada em Capela, donde leva a sua visão sobre Paris, Lumen não reconhece mais a Paris que vem de deixar. Os raios luminosos partidos da Terra, não chegando a Capela senão depois de setenta e dois anos, lhe chegava a imagem do que ali se passou em 1793.

Ali está a parte realmente científica do relato; todas as dificuldades nele são resolvidas da maneira mais lógica. Os dados, admitidos em teoria pela ciência, ali são demonstrados pela experiência; mas esta experiência não podendo ser feita diretamente pelos homens, o autor supõe um Espírito que dá conta dessas sensações, e colocado em condições de poder estabelecer uma comparação entre a Terra e o mundo que habita.
A idéia é engenhosa e nova. É a primeira vez que o Espiritismo verdadeiro e sério, embora sob o anonimato, é associado à ciência positiva, e isto por um homem capaz de apreciar um e o outro, e de compreender o traço de união que deverá religá-los um dia. Esse trabalho, ao qual reconhecemos, sem restrição uma importância capital, nos parece ser um daqueles que os Espíritos nos anunciaram como devendo marcar o presente ano.

Analisaremos esta segunda parte num próximo artigo.
Revista Espírita
Março de 1867
Allan Kardec


sábado, 25 de julho de 2009

Passando a Terra a Branco

Volto ao mundo branco, mas já sei que estou também no "hospital espírita"
onde me guarda o Anjo Raul, que não era Seixas. Eu estava também presente em
alguma lembrança ou outra das muitas leituras que você fez do que eu vivi na
Terra e talvez eu seja apenas fruto dos escritos de um cronista maluco.

Se eu, mesmo sendo apenas letras que entram na sua cabeça, sou real,
imagina o Anjo? Na dúvida, ele que me guardasse.

Não quero criar polêmica, mas é melhor você repensar sobre a sua idéia de
pós-morte e compreender que todos os livros que contam experiências além da
vida são livros escritos por gente que está aí, ou gente que diz que gente
que está aqui disse pra ele que era assim ou assado.

De certa forma, eles estão dizendo a verdade, a vida além da Terra é
exatamente como eles pensaram e escreveram, só se esqueceram de mencionar
que assim como todo mundo possui uma identidade e vive uma vida terrena
diferenciada, por mais que pareça igual; o desencarne vai desembocar em uma
via de visão única, ou seja, o céu ( ou o inferno) é aquilo que você espera
que seja.

A vida além da morte é um mundo branco que você pinta com as cores do seu
pré conceito. Leia direito! Leia direito! Leia uma vez mais, devagar e
direito!

Quanto mais aberto para o novo você estiver, quanto menos comprar os planos
de céu dos outros, menos você sofrerá por aqui.

Você sabe aquela da loira que desencarnou e perguntou ao seu mentor:

- Posso na próxima reencarnação, nascer com mais peito. Esse negócio de
silicone é uma caída só!

O mentor respondeu:

- Hellooo!!! Nem todo mundo reencarna, filha!

Não entendeu a piada? Volte três parágrafos. Sacou a graça, avance uma
linha!

Sim, se a vida na Terra não é sempre justa, você acha que aqui seria
diferente? Que basta morrer e chegar aqui querendo lugar VIP ao lado do
Senhor? Que não pensando sobre o assunto, vai tornar a passagem mais
vaselina?

Menos ego e mais eu, né gente!

Voltando ao seu mundo, posso afirmar que a vida na terra também é um mundo
branco.

Você pode usar as tintas do seu coração e pintar uma vida melhor agora
mesmo, basta estancar a ferida no peito da arrogância e viver o melhor que
puder. Não se preocupe com os seus erros, se concentre no acertar.

Se achar que está ficando louco, relaxe: o louco não sabe que é louco, nem
vê a loucura ao seu redor. E ainda assim, mesmo sendo louco, podemos ser
felizes, se tivermos plantado flores no jardim coletivo; se tivermos
cultivado amores, família, amigos e a fé. Sim, na falta da certeza de que há
algo além, cultive a fé, acredite que se nascemos com essa curiosidade de
sabermos se somos a causa de algo que veio antes, pode crer que há algo
depois, sempre há.

A verdade, como dizia um amiga, é que nem a bunda da gente, cada um tem a
sua. A minha verdade, caro leitor, é a sua leitura. Eu existo por ela, ela
que é a razão do meu mundo branco. A sua leitura é o alazão negro da minha
loucura e a vontade de te mostrar o que há pelo estranhamento é o meu mundo
branco, onde as palavras são flores bonitas pintadas na parede da sua
imaginação.

Vou deixá-lo agora, amigo leitor.

O meu Anjo da Guarda, quer me ensinar violão. Será que ele ficará bravo se
eu pedir pra ele tocar Raul?

Cronicas do Frank

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Artigo: Brasil não deve celebrar concordata com Vaticano

Publicada em 11/05/2007 às 17h23m

Por Aldir Guedes Soriano

Concordatas, no contexto do direito internacional, são tratados ou acordos bilaterais entre a Santa Sé e um Estado-parte cujo objeto verse sobre assuntos de interesse religioso da Igreja Católica. Alguns países como Itália, Portugal e Alemanha passaram pela experiência concordatária. Foi por meio de dois acordos assinados por Benito Mussolini em 1929 - conhecidos como Tratados de Latrão - que nasceu o Estado soberano da cidade do Vaticano, com personalidade jurídica internacional e aptidão para celebrar tratados internacionais.

No Brasil, a partir do decreto 119-A (1890), de autoria de Rui Barbosa, instaurou-se a separação entre a Igreja e o Estado, que foi recepcionada pela nova ordem republicana em 1891. Foi assim que o Brasil se tornou laico. A Igreja Católica perdeu privilégios, deixou de ser a igreja oficial do Estado. Por conseguinte, as liberdades de crença e culto foram sensivelmente ampliadas. Segundo Serbin, não passou muito tempo até que a Igreja intentasse restabelecer os privilégios perdidos por meio de "concordata moral" ou informal. Entretanto, nenhuma concordata foi efetivamente formalizada e o país ainda permanece laico, por força do art. 19 da Constituição de 1988.

Em 2002, o Vaticano pretendeu celebrar uma concordata com o Brasil. Nessa ocasião, o consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros, elaborou parecer desaconselhando a realização do tratado. Entretanto, em agosto de 2006, surgiram indícios de nova tentativa concordatária que seria efetivada com a visita do Papa Bento XVI, programada para o ano de 2007. Esses rumores foram levantados por ocasião do 6º Colóquio Latino-Americano da Liberdade Religiosa, realizado na cidade do Rio de Janeiro. Tais indícios foram relatados pela Professora Roseli Fischmann em artigo publicado no jornal "Folha de São Paulo" (Cotidiano, 14/09/2006).

Os rumores de 2006 se confirmaram no segundo dia de visita de Bento XVI ao Brasil (10/04/2007). Em seu encontro com o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que ocorreu no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo, o Papa manifestou a intenção de assinar acordo com o Brasil envolvendo privilégios tributários e o ensino religioso nas escolas públicas, segundo o site "BBC Brasil". Cumpre salientar que um acordo dessa natureza se classifica como concordata.

Concordatas são inconstitucionais no contexto laico ou não-confessional. Nesse sentido pontua o internacionalista Valerio Mazzuoli. Para o jurista italiano Paolo Barile, os privilégios almejados pela Igreja Católica, consentâneos à lógica concordatária, são repugnantes sob o ponto de vista laicista. O reconhecimento da Santa Sé como pessoa jurídica de direito internacional não justifica nenhum privilégio em detrimento das demais confissões religiosas.

A perpetuação da supremacia católica foi um dos objetivos precípuos do regime concordatário. Nesse sentido, pontua Jónatas Machado, para quem "a celebração de concordatas com a Igreja Católica foi muitas vezes instrumento de obtenção ou consolidação de privilégios traduzidos num tratamento jurídico mais favorável em relação às demais confissões religiosas".

Um acordo bilateral (concordata) entre o Vaticano e um Estado laico pode ser considerado uma degeneração ou patologia do direito internacional. Tal acordo, além de injustificável, comprometeria as liberdades de consciência, crença e culto das demais religiões e confissões religiosas existentes na sociedade brasileira. Isso abalaria os princípios da democracia constitucional e liberal.

O presidente Lula recusou, com toda a razão, a proposta de acordo (concordata) do Papa Bento XVI e optou pela preservação do Estado Laico. Não obstante, a ameaça ainda remanesce, uma vez que o Vaticano pretende repetir a iniciativa, no final do ano e, se possível, assinar o documento até 2010. Esse assunto merece toda a atenção da sociedade brasileira. O país não pode retroceder na história e não deve caminhar em direção contrária à modernidade e à liberdade. Portanto, o Brasil não deve, jamais, celebrar uma concordada com o Vaticano.

Aldir Guedes Soriano é advogado e membro da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB-SP

http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2007/05/11/295719017.asp

 

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Outros links sobre o assunto

O QUE É A CONCORDATA:
http://www.geledes.org.br/o-que-e-a-concordata.html

BRASIL NAO DEVE CELEBRAR CONCORDATA COM O VATICANO:
http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2007/05/11/295719017.asp

ABAIXO ASSINADO CONTRA CONCORDATA BRASIL VATICANO
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2008/11/434571.shtml

DEGENERACAO DO DIREITO INTERNACIONAL
http://www.aldirsoriano.com.br/artigos_13.htm

ACORDO ENTRE BRASIL E VATICANO AMEACA O ESTADO LAICO E AS LIBERDADES FUNDAMENTAIS
http://www.acaoeducativa.org.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=1843&Itemid=2

ANDAMENTO DO PROCESSO:
http://www2.camara.gov.br/comissoes/credn

CNBB QUER APROVACAO RAPIDA DO ESTATUTO
http://www2.camara.gov.br/homeagencia/materias.html?pk=136211

PARA CADASTRAR NA CAMARA DO DEPUTADOS E RECEBER NOTICIAS, INCLUSIVE TRABALHO DO SEU DEPUTADO:
http://www2.camara.gov.br/sispush

PARA ENVIAR A NOSSA POSIÇÃO AOS DEPUTADOS
http://www2.camara.gov.br/canalinteracao/faledeputado

Eis a reportagem da CBN, no link do Youtube, retirado da Rádio CBN.

http://www.youtube.com/watch?v=mNbKY1ej6Ng

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Influências invisíveis

 
Somos corpos expostos ao vento gelado tal qual sobreviventes de uma queda nos Andes. Sofremos tantas influências que raramente nos damos conta.
 
O primeiro e mais adorável ser que nos influencia é o orgulho. Ele nos coloca no colo, nos aconchega nos braços, cochicha em nossos ouvidos sobre nossa importância, nos conta sobre nossos valores. Ele nos faz bem, parecemos seguros, acreditamos no poder de nossa utilidade. Nossa bondade é bandeira erguida em mastro dourado. Ahhh! Como é sedutor este amante de corações inseguros e perdidos, de espíritos hesitantes no caminho do progresso.
 
Mas existe outra doce influência, a vaidade, estreitamente ligada ao orgulho a vaidade é como neblina suave, que turva a vista que não a percebe. Tece um emaranhado invisível de fios que parecem nos sustentar no ar. É como mãe provedora, nos oferece tudo que a ilusão lhe permite.
 
O prazer surge tal qual magnífica música divina, nos tornamos pequenos roedores em um conto infantil e seguimos pelo desejo a mais bela flauta mágica. Ahhh como é doce o som do elogio, como e suave o carinho da atenção. 
 
Nesta caminhada seguimos com os olhos fechados, cegos conscientes,
 
Por fim, eis que não vimos as fendas afiadas e nelas desabamos. Feridos e raivosos, maldizemos o caminho, enquanto se divertem outros tolos. Paramos cansados de nossos próprios gritos e percebemos que houve sempre a escolha.
 
Sem conseguir esconder-nos de nós mesmos, choramos em prantos infantis. É nesse instante que se aproveita o mais cruel influenciador.
 
O desânimo chega tal qual um leve vento, sua influência é mortal, pode derrubar um herói e sequestrar a esperança. Deixa-nos na chuva fria e nos mostra a realidade. Senta ao nosso lado e se diz companheiro. Nas palavras parece escorrer a razão, no olhar uma sinceridade cortante. Tuas verdades são como pequenas chagas que parecem não curar. Paciente e perseverante não demonstra cansaço ou irritação, nos acompanha por quanto tempo quisermos.
 
Somos todos culpados de nossas quedas e pelos caminhos turbulentos, pelo fato de não compreendermos a vida, maldizemos a pedra que machuca o dedo, maldizemos o frio que gela o corpo e o calor que nos fatiga. Queremos algo que não existe. Uma ilusão que chega ao fim com a luz do conhecimento.
 
 

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Fw: ONG Sorriso

 



LEIAM E DIVULGUEM POR FAVOR


A ONG Sorriso faz um um trabalho super bonito no mundo todo e eles estão a caminho do Brasil no inicio de agosto, fazendo uma triagem para cirurgias gratuitas em crianças.
Repassem!! De repente a gente consegue ajudar alguém!




ONG SORRISO.jpg


 



quarta-feira, 27 de maio de 2009

Uma história chinesa

Uma história chinesa mostra a transformação radical que ocorre na alma humana ao exercitar o amor pelo outro, manifestado sob a forma de carinho, cuidado e atenção, o húmus fértil onde pode nascer aquele que é o mais precioso dos sentimentos: – "A pequena Sun Tui, esposa do filho de um mercador, tinha como sogra uma megera, que deixava todas as tarefas da casa para Sun Tui fazer. Era um tal de "Sun Tui, faz minhas tranças "para cá, "Sun Tui ", dê de comer aos porcos " para lá, um inferno para a jovem que era ainda quase uma criança. Sun Tui não tinha nem um minuto de descanso e odiava a sogra.

Desesperada, um dia ela foi ao mestre herborista da vila implorar um veneno para colocar no chá da sogra. Contou, chorando, toda a triste história de suas desgraças, e o especialista em ervas decidiu ajudá-la. "Vou lhe dar um veneno potentíssimo, de ação lenta e segura " , disse ele. " Mas é preciso dá-lo aos pouquinhos , todos os dias . Assim ninguém suspeitará de você nem de mim quando sua sogra morrer . Nesse período , para evitar suspeitas , você deve fingir tratar sua sogra com todo carinho , satisfazendo seus caprichos com alegria, cuidando dela com amor e tolerância", continuou o herborista. "Só assim poderei ajudá-la ", concluiu.

Sun Tui aceitou imediatamente as condições e desdobrou-se em cuidados. Antecipava os desejos da megera, trazia flores e mimos para arrancar seus sorrisos , caprichava nos bolos e doces que servia no lanche da tarde. A casa vivia brilhando e ela não reclamava mais ao marido. Mas não se esquecia de colocar o veneno no chá da sogrinha toda noite.

Acontece que, com as novas atitudes da nora, a megera amoleceu . Num dia pediu para Sun Tui sentar e descansar aos seus pés, enquanto lhe contava uma história. No outro, separava um lindo corte de brocado para a jovem fazer um vestido. Ou então presenteava-a com pulseiras e anéis de jade, para que pudesse ficar mais bonita. Quem as visse, pensaria que eram mãe e filha.

Sun Tui também começou a abrandar. O carinho, o cuidado e a preocupação com a sogra passaram a ser reais. E certo dia, arrependida por ter tido vontade de matar sua antiga inimiga, voltou desesperada ao herborista – dessa vez para implorar por um antídoto.

O mestre escutou pacientemente as lamúrias de Sun Tui. Pediu o veneno de volta e ela, obediente, entregou o pacotinho. Diante dos olhos arregalados da menina, o herborista despejou o conteúdo de uma só vez no chá e o tomou. Sorrindo. O velho herborista, que conhecia a alma humana, tinha usado de um artifício para despertar o coração da menina. Nunca houve veneno e nem era preciso o antídoto. Sun Tui tinha aprendido a amar".

Amar é assim, mais que um sentimento platônico é uma forma de conduta; e a conduta reiterada gera o "nosso jeito de ser" perceptível pelo outro. Amar é verbo e verbo é ação:

-É acarinhar, é cuidar, é tolerar, é atender ao outro, é dedicar-se ao outro de uma forma tão constante que o outro passa a confiar nessa relação sem medo de ser ferido em seus sentimentos. Quem ama pratica os verbos do amor sem esperar retribuição. Ama.

Simplesmente ama.

Fonte: Vida Simples – Editora Abril  

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Esperanto!


Olá amigos!!!


O Fórum tem novo estudo este mês! Conheça e participe.




Bjs

Claudia

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Vamos iniciar um grupo Espírita?

Olá amigos

Estou indicando este estudo no Forum Espírita!! Se quiser conhecer basta clicar na imagem.


Bjs
Claudia

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Por que o Espiritismo teria que se considerado religião?

Queridos amigos:

Faço este questionamento, para a apreciação de todos:


Por que o Espiritismo teria que se considerado religião?
Qual a vantagem, quais os benefícios e quais os méritos que a nossa doutrina passa a ter, se considerada como religião?
Pelos exemplos que a religião tem dado ao mundo, em toda a sua história e até nos dias atuais, considerar o Espiritismo como tal é um mérito ou um tremendo desrespeito para com a Doutrina?
Por quais razões muitos espíritas fazem tanta questão disto?
Será que os cuidados com os aspectos morais, o amor ao próximo, a caridade, a fraternidade e esses valores que a doutrina nos ensina, só são possíveis de serem praticados com a rotulação de religião?
Para falar em Jesus, para ter Jesus como modelo e guia, necessariamente temos que ser religião? Se ele mesmo nunca pregou religião nenhuma, por que temos que ser submissos a essa tradição equivocada?
Por acaso, o valor do Espiritismo será diminuído, se ele não tiver a qualificação como religião?
Se o próprio Kardec, no livro "O que é Espiritismo", em seu diálogo com o Padre, deixou bem claro que a proposta do Espiritismo não é ser religião, ele passou a ser CONSIDERADO como religião, por causa da intolerância religiosa; por que os espíritas não prestam atenção nisto e insistem nessa coisa de ter que ser religião?
Desvinculemos Jesus da idéia religião, porque não tem nada uma coisa a ver com outra.
Desvinculemos Moral e Valores Espirituais de religião, porque não tem uma coisa a ver com outra.
Religião significa RE-LIGAÇÃO. Quando a idéia foi criada, a proposta, que partia do princípio que o homem havia se DESLIGADO de Deus, por conta da estória de Adão, Eva e a Cobra, era de fazer com que aquilo que ESTAVA DESLIGADO se religasse novamente. Ora, se o Espiritismo não admite essa estória infantil, se é uma doutrina adepta do Evolucionismo e não do Criacionismo, por que insistir nisto? O que tem a ver com isto? Como é possível religar o que nunca desligou?
Por acaso, você conseguiria religar uma lâmpada, em sua casa, que não esteja desligada?
Religião, ao contrário de ser sintonia com Deus, nada mais é do que intolerância, proibições, obrigações, patrulhamento da vida das pessoas, submissão, exigências de obediências a dogmas, inclusive no movimento espírita, formação de sacerdócio organizado (no movimento espírita não existe a figura do Cardeal, do Bispo e dos Padres, que dão as ordens ao povo, mas existe a mesma coisa, com outro nome, que são os Membros da Diretoria da Casa, os Conselhos, que fazem exatamente a mesma coisa: Dão ordens, proibem, censuram, boicotam, sabotam, levam expositores ao index librorum prohibitorum, jogam a imagem de confrades de encontro a todos os outros, portanto, qual a diferença?), tem os seus rituais, sim (Todos em silêncio, vamos à prece de abertura, depois a palestra, depois a prece de encerramento para agradecer à Jesus, depois o passe, depois a água fluidificada...), e ai quem se atreve a querer mudar isto. O centro espírita é, por muitos, considerado a "casa de Deus", quando muitos proíbem as pessoas de sorrirem, de ficarem alegres, tem que falar baixo, dizem que "o silêncio é uma prece" (desde quando, silêncio é prece?), cheio de "psiu" em tudo quanto é canto, se um casal chega abraçado, mandam que desabracem, porque ali é "casa de respeito" (desde quando um abraço é manifestação de desrespeito?)... enfim, a postura e a máscara religiosa é coisa intragável, chata, insensata e inadmissível à pessoas que raciocinam.
Para que religião?

Abração a todos.

Alamar Régis Carvalho
alamar@redevisao.net
http://www.redevisao.net/


terça-feira, 10 de março de 2009

DOS ANIMAIS

Há entre vós uma coisa que sempre vos excita a atenção e a curiosidade. Esse mistério, pois que o é e grande para vós, é a ligação, ou antes, a distância existente entre a vossa alma e a dos animais, mistério que, a despeito de toda a sua ciência, Buffon, o mais poético dos naturalistas, e Cuvier, o mais profundo, jamais puderam penetrar, assim como o escalpelo não vos detalha a anatomia do coração. Ora, sabeis, os animais vivem, e tudo o que vive pensa.


REVISTA ESPÍRITA
Jornal de Estudos Psicológicos
Publicada sob a direção de Allan Kardec

julho de 1860


(DISSERTAÇÕES ESPONTANEAS FEITAS PELO ESPIRITO DE CHARLET,
EM VÁRIAS SESSÕES DA SOCIEDADE)

Há entre vós uma coisa que sempre vos excita a atenção e a curiosidade. Esse mistério, pois que o é e grande para vós, é a ligação, ou antes, a distância existente entre a vossa alma e a dos animais, mistério que, a despeito de toda a sua ciência, Buffon, o mais poético dos naturalistas, e Cuvier, o mais profundo, jamais puderam penetrar, assim como o escalpelo não vos detalha a anatomia do coração. Ora, sabeis, os animais vivem, e tudo o que vive pensa. Não se pode, pois, viver sem pensar.

Assim sendo, resta demonstrar-vos que quanto mais o homem avança, não conforme o tempo, mas conforme a perfeição, mais penetrará a ciência espiritual, o que se aplica não somente a vós, mas ainda os seres que estão abaixo de vós: os animais. Oh! Exclamarão alguns homens persuadidos de que o vocábulo homem significa todo o aperfeiçoamento, mas há um paralelo possível entre o homem e o bruto? Podeis chamar inteligência aquilo que não passa de instinto? Sentimento o que é apenas sensação? Numa palavra, podeis rebaixar a imagem de Deus? Responderemos: houve um tempo em que a metade do gênero humano era considerada do nível irracional, onde o animal não figurava; um tempo, agora o vosso, em que a metade do gênero humano e encarada como inferior e o animal como bruto. Então? Do ponto de vista espiritual a coisa é diferente. O que os Espíritos superiores diriam do homem terreno, os homens dizem dos animais.

Tudo é infinito na Natureza: o material como o espiritual. Ocupemo-nos, pois, um pouco, desses pobres brutos, falando espiritualmente, e vereis que o animal vive realmente, desde que pensa.

Isto serve de prefácio a um pequeno curso que darei a respeito. Alias, em vida, eu havia dito que a melhor companhia do homem era o cão.

Continua no próximo número.

CHARLET


O mundo é uma escada imensa, cuja elevação é infinita, mas cuja base repousa num horrível caos. Quero dizer que o mundo não é senão um progresso constante dos seres. Estais muito embaixo, sempre, mas haverá muito abaixo de vós. Porque, ouvi bem, não falo apenas de vosso planeta, mas de todos os mundos do universo. Não temais, porém, pois nos limitaremos na Terra.

Antes disso, entretanto, duas palavras sobre um mundo chamado Júpiter, do qual o engenhoso e imortal Palissay vos deu alguns esboços estranhos e tão sobrenaturais para a vossa imaginação. Lembrai-vos de que nesses encantadores desenhos ele vos representou alguns animais de Júpiter. Não há neles um progresso evidente e podeis negar-lhes um grau de superioridade sobre os animais terrestres? E ainda só vedes nisso um progresso de forma e não de inteligência, posto que a atividade de que se ocupam não possa ser executada pelos animais terrestres. Só vos cito este exemplo para vos indicar desde logo uma superioridade de seres que estão muito abaixo de vós. Que seria se vos enumerasse todos os mundos que conheço, isto é, cinco ou seis? Mas limitando-nos à Terra, vede a diferença que entre eles existe. Então! Se a forma é tão variada, tão progressiva, que mesmo na matéria há progresso, podeis deixar de admitir o progresso espiritual desses seres? Ora, sabei-o, se a matéria progride, mesmo a mais atrasada, com mais forte razão o espírito que o anima.

Continuarei da próxima vez.

CHARLET


Nos mundos adiantados, os animais são de tal modo superiores que a mais rigorosa ordem lhes é dada pela palavra, e entre vós, muitas vezes, a pauladas. Em Júpiter, por exemplo, basta uma palavra, e entre vós as chicotadas não bastam. Contudo, há um sensível progresso em vossa Terra, jamais explicado: é que o próprio animal se aperfeiçoa. Assim, outrora o animal era muito mais rebelde apo homem. Também há progresso de vossa parte, por terdes instintivamente compreendido esse aperfeiçoamento dos animais, pois que vos proibis de bater-lhes. Eu dizia que há progresso moral no animal. Há também progresso de condição. Assim, um pobre cavalo açoitado, ferido por um carroceiro mais brutal que ele, comparativamente estará numa condição muito mais tranqüila, mais feliz que a de seu carrasco. Não é de toda justiça, e devemos acaso admirar-nos de que um animal que sofre, que chora, que é reconhecido ou humilhado, conforme a suavidade ou a crueldade de seus donos, tenha a recompensa por haver pacientemente suportado uma vida cheia de torturas? Antes de tudo, Deus é justo: "Todo ser fraco que tiver sofrido será recompensado". Sempre comparativamente ao homem, entendo, e ouso acrescentar, para concluir, que por vezes o animal tem mais alma, mais coração que o homem, em muitas circunstâncias.

CHARLET


Em vosso globo a superioridade do homem se manifesta por essa elevação da inteligência que o torna o rei da Terra. O lado do homem, o animal é muito fraco, muito inferior e, pobre escravo desta terra de provação, por vezes tem que suportar caprichos cruéis de seu tirano: o homem! A antiga metempsicose era uma lembrança muito confusa da reencarnação e, contudo, essa mesma doutrina não passa de crença popular. Os grandes Espíritos admitiam a reencarnação progressiva; não compreendendo como eles o Universo, a massa ignorante naturalmente dizia: Desde que o homem se reencarna, isto não pode ser senão na Terra; então sua punição, seu tártaro, sua provação é a vida no corpo de um animal; absolutamente como na Idade Média, os cristãos diziam: É no grande vale que se dará o julgamento, após o que os condenados irão para baixo da terra queimar-se em suas entranhas.

Acreditando na metempsicose, os antigos acreditavam portanto, em espíritos de animais, desde que admitiam a passagem da alma humana para corpos de animais. Pitágoras lembrava-se de sua  antiga existência e reconhecia o escudo que usava no cerco de Tróia. Sócrates morre predizendo sua nova vida.

Desde que, como disse, tudo é progresso no universo, desde que as leis de Deus não são e não podem ser senão leis do progresso, do ponto de vista em que estais, do ponto de vista de vossas tendências espiritualistas, não admitir o progresso do que está abaixo do homem seria insensato e uma prova de ignorância ou de completa indiferença.

Como o homem, o animal tem aquilo a que chamais consciência, e que não é outra coisa senão a sensação da alma quando fez o bem ou o mal? Observai e vede se o animal não da prova de consciência, sempre, relativamente ao homem. Credes que o cão não saiba quando fez o bem ou o mal? Se não o sentisse, não viveria. Como já vos disse, a sensação moral, numa palavra, a consciência, existe nele como no homem, sem o que seria preciso negar-lhe o sentimento de gratidão, o sofrimento, os pesares, enfim todos os caracteres de uma inteligência, caracteres que todo homem sério pode observar em todos os animais, conforme seus diversos graus, porque, mesmo entre eles, há diversidades singulares.

CHARLET


Rei da Terra pela inteligência, o homem é também um ser superior do ponto de vista material. Suas formas são harmoniosas e, para se fazer obedecer, seu Espírito tem um organismo admirável: o corpo. A cabeça do homem é alta e olha o céu, diz o Gênesis; o animal olha a terra e, pela estrutura de seu corpo, a ela parece mais ligado que o homem. Além disso, a harmonia magnífica do corpo humano não existe no animal. Vede a infinita variedade que os distingue uns dos outros e que, entretanto, não corresponde ao seu Espírito, porque os animais - e entendo sua imensa maioria - tem, quase todos, o mesmo grau de inteligência. Assim, no animal variedade de forma; ao contrário, no homem, variedade de Espírito. Tomai dois homens que tenham os mesmos gostos, aptidões, inteligência; tomai um cão, um cavalo, um gato, numa palavra, mil animais e dificilmente notareis diferenças em sua inteligência. Assim, o Espírito dorme no animal; no homem brilha em todos os sentidos; seu Espírito adivinha Deus e compreende a razão de ser da perfeição.

Assim, pois, no homem, a harmonia simples da forma, começo do infinito no Espírito; e vede agora a superioridade do homem que domina o animal, materialmente por sua estrutura admirável e intelectualmente por suas imensas faculdades. Parece que, nos animais, aprouve a Deus variar mais a forma, encerrando o Espírito; ao contrário, no homem, fazer do próprio corpo humano a manifestação material do Espírito.

Igualmente admirável nessas duas criações, a Providência tanto é infinita no mundo material quanto no espiritual. O  homem está para o animal como a flor e todo o reino vegetal estão para a matéria bruta.

Nestas poucas linhas quis eu estabelecer o lugar que deve ocupar o animal na escala da perfeição. Veremos como pode elevar-se comparativamente ao homem.

CHARLET


Como se eleva o Espírito? Pela submissão, pela humildade. O que perde o homem é a razão orgulhosa, que o impele a desprezar todo subalterno e invejar todo superior. A inveja é a mais viva expressão do orgulho; não é o prazer do orgulho, é o desejo doentio, incessante, de poder goza-lo. Os invejosos são os mais orgulhosos, quando se tornam poderosos. Olhai o mestre de todos vós, o Cristo, o homem por excelência, mas na mais alta fase da sublimidade. O cristo, digo eu, em vez de vir com audácia e insolência para derrubar o mundo antigo, vem a Terra encarnar-se numa família pobre e nasce entre os animais. Porque encontrareis por toda parte esses pobres animais, a todos os instantes, onde o homem vive simplesmente com a natureza, numa palavra, pensando em Deus. Nasce entre os animais e estes lhe exaltam o poder  na sua linguagem tão expressiva, tão natural e tão simples. Vede que tema para reflexão! O Espírito em toda a sua essência de perfeição. Balaão, o falso profeta, o orgulho humano em toda a sua corrupção, blasfemou contra Deus e bateu no seu animal. De súbito, o Espírito ilumina o Espírito ainda muito vago no jumento e este fala. Por um instante torna-se igual ao homem e, por sua palavra, é o que será nalguns milhares de séculos. Poderíamos citar muitos outros fatos, mas este me parece bem notável, a propósito do que eu dizia sobre o orgulho do homem, que nega até a sua alma, por não poder compreende-la, e vai até a negação do sentimento entre os seres inferiores, entre os quais o Cristo preferiu nascer.

CHARLET


Eu vos entretive durante algum tempo com o que vos havia prometido. Como disse de começo, não falei do ponto de vista anatômico ou médico, mas apenas da essência espiritual que existe nos animais. Terei ainda que falar sobre outros vários pontos que, sendo bem diferente, não são menos úteis à doutrina. Permiti-me uma última recomendação, a de refletirdes um pouco sobre quanto eu disse: nem é extenso, nem pedante e, crede-me, nem por isso é menos útil. Um dia, quando o Bom Pastor dividir suas ovelhas, que vos possa contar entre os bons e excelentes animais que tiverem seguido melhor os seus preceitos. Perdoai esta imagem pouco viva. Ainda uma vez, precisais refletir no que vos digo. Alias, continuarei a vos falar enquanto quiserdes. Terei que vos dizer outra coisa da próxima vez, para definir meu pensamento sobre a inteligência dos animais.
 
Todo vosso,

CHARLET


Tudo quanto vos posso dizer no momento, amigos, é que vejo com prazer a linha de conduta que seguis. Que a caridade, esta virtude das almas verdadeiramente francas e nobres, seja sem pré o vosso guia, pois é o sinal da verdadeira superioridade. Perseverai neste caminho que necessariamente vos deve conduzir, a todos, a despeito dos esforços cuja força não suspeitais, à verdade e à unidade.

A modéstia também é um dom muito difícil de adquirir; não é, senhores? É uma virtude bastante rara entre os homens. Pensai que para progredir na via do bem e do progresso, só tendes que usar a modéstia. Sem Deus, sem seus divinos preceitos, que sereis? Um pouco menos que esses pobres animais dos quais vos falei, e sobre os quais tenho ainda a intenção de vos entreter. Cingi os rins e preparei-vos para lutar de novo, mas não fraquejeis. Pensai que não é contra Deus que lutais, como Jacó, mas contra o Espírito do mal, que invade tudo e a vós próprios, a cada instante.

O que vos tenho a dizer seria muito longo para esta noite. Tenho a intenção de vos explicar a queda moral dos animais, após a queda moral do homem. Para concluir o que vos disse e o primeiro animal tornado feroz.

Desconfiai dos maus Espíritos. Não suspeitais de sua força, disse-vos há pouco. E embora esta última frase não se relacione com a precedente, não é menos verdadeira e muito a propósito. Agora, refleti.

CHARLET


Quando foi criado o primeiro homem, era tudo harmonia na Natureza. A Onipotência do Criador tinha posto em cada ser uma palavra de bondade, de generosidade e de amor. O homem era radioso; os animais desejavam seu olhar celeste e suas carícias eram as mesmas para eles e para a sua celeste companheira. A vegetação era luxuriante; o sol dourava e iluminava toda a Natureza, como o sol misterioso da alma, centelha de Deus, iluminava interiormente a inteligência do homem. Numa palavra, todos os reinos da Natureza apresentavam essa calma infinita, que parecia compreender Deus; tudo parecia ter bastante inteligência para exaltar a Onipotência do Criador. O céu sem nuvens era como o coração do homem, e a água límpida e azul tinha reflexos infinitos, como a alma do homem tinha os reflexos de Deus.

Muito tempo depois tudo pareceu mudar subitamente. A Natureza oprimida soltou um longo suspiro e, pela primeira vez, a voz de Deus se fez ouvir. Terrível dia de desgraça, em que o homem, que até então não tinha ouvido senão a grande voz de Deus, que lhe dizia em tudo: "Tu és imortal", ficou apavorado com essas coisas terríveis palavras: "Caim, por que mataste teu irmão?" Logo, tudo mudou: o sangue de Abel espalhou-se por toda a Terra; as árvores mudaram de cor; a vegetação, tão rica e colorida, murchou; o céu tornou-se escuro.

Por que o animal se tornava feroz? Magnetismo todo poderoso, invencível, que então tomou as criaturas, a sede de sangue, o desejo de carnagem brilhavam em seus olhos, outrora tão suaves, e o animal tornou-se feroz como o homem. Pois o homem, que tinha sido e rei da Terra, não havia dado o exemplo? O animal seguiu o seu exemplo e desde então a morte planou sobre a terra, morte que se tornou odiosa, em vez de uma transformação suave e espiritual. O corpo do homem deveria dispersar-se no ar, como o corpo do Cristo, e dispersou-se na terra, nessa terra regada pelo sangue de Abel. E o homem trabalhou, e o animal trabalhou.

CHARLET

* * * * *

EXAME CRÍTICO

DAS DISSERTAÇÕES DE CHARLET SOBRE ANIMAIS

1. Dizeis: Tudo o que vive, pensa. Então não se pode viver sem pensar. A proposição nos parece algo absoluta, pois a planta vive e não pensa. Admitis isto como um princípio?
R - Sem dúvida. Só falo da vida animal e não da vida vegetal. Deveis compreende-lo.

2. Mais adiante dizeis: Vereis que o animal vive realmente, desde que pensa. Não há inversão na frase? Parece que a proposição é: Vereis que o animal pensa, realmente, desde que vive.
R - Isto é evidente.


SOBRE O II

3. Lembrais o desenho feito dos animais de Júpiter. Nota-se que tem uma notável analogia com os sátiros da fábula. Essa idéia dos sátiros seria uma intuição da existência desses seres em outros mundos e, neste caso, não seria mera criação fantástica?
R - Quanto mais o novo mundo, mais ele se lembrava. O homem tinha a intuição de uma ordem de seres intermediários, ora mais atrasados que ele, ora mais adiantados. Era o que ele chamava os deuses.

4. Então admitis que as divindades mitológicas não eram senão o que chamamos Espíritos?
R - Sim.

5. Foi-nos dito que em Júpiter é possível o entendimento pela simples transmissão do pensamento. Quando os habitantes desse planeta se dirigem aos animais, que são seus servidores e operários, recorrem a uma linguagem articulada particular? Para os animais teriam uma linguagem articulada e, entre si, a do pensamento?
R - Não, não há linguagem articulada, mas uma espécie de magnetismo poderoso que faz curvar o animal e o leva a executar os menores desejos e as ordens de seus senhores. O Espírito todo poderoso não pode curvar-se.

6. Evidentemente, entre nós os animais tem uma linguagem, pois se compreendem, mas é muito limitada. Os de Júpiter tem uma linguagem mais precisa e positiva que os nossos? Numa palavra, uma linguagem articulada?
R - Sim.

7. Os habitantes de Júpiter compreendem melhor que nós a linguagem dos animais?
R - Vêem através deles os compreendem perfeitamente.

8. Examinando a série dos seres vivos, encontra-se uma cadeia ininterrupta, desde a madrépora, a própria planta, até o animal mais inteligente. Mas entre o animal mais inteligente e o homem há uma evidente lacuna, que em algum lugar deve ser preenchida, porque a Natureza não deixa elos vazios. De onde vem essa lacuna?
R - Essa lacuna dos seres é apenas aparente; não existe na realidade: vem das raças desaparecidas (São Luiz).

9. Tal lacuna pode existir na Terra, mas certamente não existe no conjunto do Universo e deve ser preenchida em alguma parte. Não o seria por certos animais de mundos superiores que, como os de Júpiter, por exemplo, parecem aproximar-se muito do homem terreno pela forma, a linguagem e outros sinais?
R - Nas esferas superiores o germe surgido da Terra desenvolveu-se e jamais se perde. Tornando-vos Espíritos, reencontrareis todos os seres criados e desaparecidos nos cataclismos do vosso globo (São Luís).


SOBRE O III

10. Dizeis que tudo se aperfeiçoa e, como prova do progresso do animal, dizeis que outrora ele era mais rebelde ao homem. É evidente que o animal se aperfeiçoa; mas, pelo menos na Terra, não se aperfeiçoa pelos cuidados do homem. Abandonado a si mesmo, retorna sua natureza selvagem, mesmo o cão.
R - E o homem se aperfeiçoa pelos cuidados de quem? Não é pelos de Deus? Tudo é escalado na Natureza.

11. Falais das recompensas para os animais que sofrem maus tratos e dizeis que é justiça que haja compensação para eles. Assim, parece que admitis no animal a consciência do eu após a morte, com a recordação do passado. Isto é contrário ao que nos foi dito. Se as coisas se passarem como dizeis, resultaria que no mundo dos Espíritos haveria Espíritos de ostras. Podeis dizer se vedes em torno de vós Espíritos de cães, de gatos, de cavalos ou elefantes, como vedes Espíritos humanos?
R -A alma do animal - tendes toda razão - não se reconhece após a morte: é um conjunto confuso de germes, que podem passar para o corpo de tal ou qual animal, conforme o desenvolvimento adquirido. Não é individualizada. Contudo, direi que em certos animais, mesmos em muitos, é individualizada.

12. Aliás, de modo algum esta teoria justifica os maus tratos dos animais. O homem é sempre culpado por fazer sofrer qualquer ser sensível, e a doutrina nos diz que por isso ele será punido. Mas daí a por o animal numa condição superior a ele, há uma grande distância. Que pensais disto?
R - Sim; mas, no entanto sempre estabeleceis uma escala entre os animais; pensais que há distância entre certas raças. O homem é tanto mais culpado quanto mais poderoso.

13. Como explicais que mesmo no mais selvagem estágio o homem se faça obedecer pelo mais inteligente animal?
R - É sobretudo a Natureza que age no caso. O homem selvagem é o homem da Natureza; conhece o animal familiarmente; o homem civilizado estuda o animal, e este se curva ante ele. O homem é sempre o homem em frente ao animal, quer seja selvagem, quer civilizado.


SOBRE O V

14. (A Charlet). Nada temos a dizer sobre este parágrafo, que nos parece muito racional. Tendes algo a acrescentar?
R - Apenas isto: os animais tem todas as faculdades que indiquei, mas neles o progresso se realiza pela educação que recebem do homem e não por si mesmos. Abandonado no estado selvagem, o animal retoma o tipo que tinha ao sair das mãos do Criador. Submetido ao homem, aperfeiçoa-se. Eis tudo.

15. Isto é perfeitamente certo para os indivíduos e as espécies. Mas se considerarmos o conjunto da escala dos seres, há uma evidente marcha ascendente, que não para nos animais da Terra, desde que os de Júpiter são física e intelectualmente superiores aos nossos.
R - Cada raça é perfeita em si mesma e não emigra para raças estranhas. Em Júpiter são os mesmos tipos, formando raças distintas, mas não são os Espíritos dos animais mortos.

16. Então em que se torna o princípio inteligente dos animais mortos?
R - Volta à massa em que cada novo animal toma a porção de inteligência que lhe é necessária. Ora, é precisamente isto que distingue o homem do animal. Naquele o Espírito é individualizado, e progride por si mesmo e é isso que lhe dá superioridade sobre todos os animais. Eis por que o homem, mesmo selvagem, como fizestes notar, se faz obedecer, mesmo pelos mais inteligentes animais.


SOBRE O VI

17. Dais a história de Balaão como fato positivo. Seriamente, que pensais disto?
R - É uma pura alegoria, ou antes, uma ficção, para castigar o orgulho. Fizeram falar o burro de Balaão. Como La Fontaine fez falar muitos outros animais.


SOBRE O XI

18. Nessa passagem Charlet parece ter sido arrastado pela imaginação, pois o quadro que faz da degradação moral do animal é mais fantástico do que científico. Com efeito, o animal é feroz por necessidade, e foi para satisfazer a essa necessidade que a Natureza lhe deu uma organização especial. Se uns devem nutrir-se de carne, é por uma razão providencial e porque era útil à harmonia geral que certos elementos orgânicos fossem absorvidos. O animal é, pois, feroz por constituição e não se conceberia que a queda moral do homem tivesse desenvolvido os dentes caninos do tigre e encurtado os seus intestinos, porque então haveria razão para que o mesmo não tivesse acontecido ao carneiro. Antes dizemos que, na Terra, sendo o homem mais adiantado, encontra-se com seres inferiores em todos os sentidos, cujo contato lhe é causa da inquietação, de sofrimentos e, consequentemente, uma fonte de provas que lhe auxiliam o progresso futuro.

Que pensa Charlet destas reflexões?
R - Apenas as posso aprovar. Eu era um pintor e não um literato ou um cientista. Por isso, de vez em quando me deixo arrastar pelo prazer, novo para mim, de escrever belas frases, mesmo com sacrifício da verdade. Ma o que dizeis é muito justo e inspirado. No quadro que tracei, bordei certas idéias recebidas, para não chocar nenhuma convicção. A verdade é que as primeiras épocas eram a idade do ferro, muito afastadas das pretensas suavidades. Descobrindo diariamente tesouros acumulados pela bondade de Deus, tanto no espaço quanto na Terra, a civilização levou o homem à conquista da verdadeira terra prometida, que Deus concederá à inteligência e ao trabalho, e que não entregou enfeitada nas mãos dos homens-crianças, que a deviam descobrir pela própria inteligência. Aliás, este erro que cometi não poderia ser prejudicial aos olhos da gente esclarecida, que o notaria facilmente. Para os ignorantes passaria inapercebido. Contudo, concordo que errei. Agi levianamente, e isto vos prova até que ponto devereis controlar as comunicações que recebeis.


OBSERVAÇÃO GERAL

Um ensinamento importante do ponto de vista da ciência espírita, ressalta destas comunicações. A primeira coisa que se destaca, ao lê-las, é uma mistura de idéias justas, profundas e com o cunho do observador, ao lado de outras, evidentemente falsas e fundadas mais na imaginação do que na realidade. Sem sombra de dúvida, Charlet era um homem acima do vulgar; mas, como Espírito, não é mais universal do que o era em vida e pode equivocar-se porque, não sendo acima bastante elevado, só encara as coisas de seu ponto de vista. Aliás, só os Espíritos chegados ao último grau de perfeição estão isentos de erros. Os outros, por melhores que sejam, nem tudo sabem e podem enganar-se; mas, quando verdadeiramente bons, o fazem de boa fé e concordam francamente, ao passo que os outros o fazem coincidentemente e se obstinam nas mais absurdas idéias. Por isso devemos guardar-nos contra o que vem do mundo invisível, sem se ter submetido ao controle da lógica. Os bons Espíritos o recomendam incessantemente e jamais se ofendem com a crítica porque, de duas uma: ou estão seguros do que dizem e, então, nada temem, ou não estão e, se tem consciência de sua insuficiência, eles mesmos buscam a verdade. Ora, se os homens podem instruir-se com os Espíritos, alguns deste podem instruir-se com os homens. Ao contrário, os outros querem dominar, esperando fazer aceitar as suas utopias por causa da sua condição de Espíritos. Então, seja presunção de sua parte ou má intenção, não suportam a contradita: querem ser acreditados sob palavra, porque sabem que vão perder no exame. Ofendem-se à menor dúvida sobre sua infantilidade e soberbamente ameaçam vos abandonar, como indignos de os ouvir. Assim, só gostam dos que se ajoelham ante eles. Não há homens assim? E é de admirar que os encontremos com seus caprichos no mundo dos Espíritos? Nos homens, uma tal característica é sempre, aos olhos de gente sensata, um indício de orgulho, de vã suficiência, de tola vaidade e, portanto, de pequenez nas idéias e de falso julgamento. O que seria um sinal de inferioridade moral nos homens, não poderia ser indício de superioridade nos Espíritos.

Como acabamos de ver, Charlet de boa vontade se presta à controvérsia; escuta e admite as objeções e responde com benevolência; desenvolve o que era obscuro e reconhece lealmente o que não era exato. Numa palavra, não quer passar por mais sábio do que é, e nisto prova mais elevação do que se obstinasse nas idéias falsas, a exemplo de certos Espíritos que se escandalizam ao simples enunciado de que suas comunicações parecem susceptíveis de comentários.

O que é ainda próprio desses Espíritos orgulhosos é a  espécie de fascinação que exercem sobre seus médiuns, através da qual por vezes os fazem compartilhar dos mesmos sentimentos. Dizemos de propósito seus médiuns, porque deles se apoderam e neles querem ter instrumentos que agem de olhos fechados. De modo algum se acomodariam a um médium perscrutador ou que visse bem claro. Não se dá o mesmo entre os homens? Quando o encontram, temendo que lhes escape, inspiram-lhe o afastamento de quem quer que o possa esclarecer. Isolam-no de certo modo, a fim de estarem em liberdade, ou não o aproximam senão daqueles de quem nada tem a temer. E, para melhor lhes captar a confiança, fazem-se de bons apóstolos, usurpando os nomes de Espíritos venerados, cuja linguagem procuram imitar. Mas, por mais que façam, jamais a ignorância poderá contrafazer o verdadeiro saber, nem uma natureza perversa a verdadeira virtude. O orgulho brotará sempre sob o manto de uma falsa humildade; e porque temem ser desmascarados, evitam a discussão e afastam seus médiuns.

Não há ninguém que, julgando friamente e sem prevenção, não reconheça como má uma tal influência, porque ressalta ao mais vulgar bom-senso que um Espírito realmente bom e esclarecido jamais procura exercê-la. Pode, pois dizer-se que todo médium que a ela se submete se acha sob o império de uma obsessão, da qual deve quanto antes procurar livrar-se. O que se quer, antes de tudo, não são comunicações a todo custo, mas comunicações boas e verdadeiras. Ora, para ter boas comunicações são necessários bons Espíritos; e para ter bons Espíritos é preciso ter bons médiuns, livres de qualquer influência má. A natureza dos Espíritos que habitualmente assistem um médium é, pois, uma das primeiras coisas a considerar. Para a conhecer exatamente há um critério infalível e não é nos sinais materiais, nem nas fórmulas de evocação ou de conjuração que será encontrada. Esse critério está nos sentimentos que o Espírito inspira ao médium. Pela maneira deste último agir, pode julgar-se a natureza dos Espíritos que o dirigem e, consequentemente, o grau de confiança que merecem suas comunicações.

Isto não é uma opinião pessoal, um sistema, mas um princípio deduzido da mais rigorosa lógica, se admitirmos esta premissa: um mau pensamento não pode ser sugerido por um bom Espírito. Enquanto não se provar que um bom Espírito pode inspirar o mal, diremos que todo ato que se afaste da benevolência da caridade e da humildade, e no qual se note o ódio, a inveja, o ciúme, o orgulho ferido ou a simples acrimônia, não pode ser inspirado senão por um mau Espírito, ainda quando este hipocritamente pregasse as mais belas máximas, porque, se fosse realmente bom, prová-lo-ia pondo seus atos em harmonia com suas palavras. A prática do Espiritismo é cercada de tantas dificuldades; os Espíritos enganadores são tão astuciosos, tão sabidos e, ao mesmo tempo tão numerosos, que não seria demais armar-se do máximo de precauções para os desalojar. Importa, pois, rebuscar com o maior cuidado todos os indícios pelos quais eles se podem trair. Ora, esses indícios estão, ao mesmo tempo, em sua linguagem e nos atos que provocam.

Tendo submetido estas reflexões ao Espírito de Charlet, eis o que disse a respeito: "Não posso senão aprovar o que acabais de dizer e aconselhar a todos quantos se ocupam do Espiritismo a seguir tão sábios conselhos, evidentemente ditados por bons Espíritos, mas que não são absolutamente - bem podeis crê-lo - do gosto dos maus, pois estes sabem muito bem que é esse o meio mais eficaz de combater a sua influência. Assim, fazem tudo quanto podem para desviar disso aqueles que querem prender em suas redes".

Charlet disse que foi arrastado pelo prazer, para ele novo, de escrever belas frases, mesmo com sacrifício da verdade. Que teria acontecido se tivéssemos publicado seu trabalho sem comentários? Teriam acusado o Espiritismo por aceitar idéias ridículas, e a nós mesmos por não sabermos distinguir entre o verdadeiro e o falso. Muitos Espíritos estão no mesmo caso: acham uma satisfação para o amor-próprio em espalhar, através dos médiuns, já que não o podem diretamente, essas peças literárias, científicas, filosóficas ou dogmáticas de grande fôlego. Mas quando tem apenas um falso saber, escrevem coisas absurdas, assim como o fariam os homens. É sobretudo nessas obras continuadas que podemos julgá-los, porque sua ignorância os torna incapazes de representar o papel por muito tempo e eles próprios revelam sua insuficiência, a cada passo, ferindo a lógica e a razão. Através de uma porção de idéias falsas, há, por vezes, algumas boas, com que contam para iludir. Tal incoerência apenas demonstra sua incapacidade: são os pedreiros que sabem alinhar as pedras da construção, mas incapazes de construir um palácio. É, por vezes, curioso ver o dédalo inextricável de combinações e de raciocínios em que se metem, e dos quais não saem senão à força de sofismas e de utopias. Vimos alguns que, a custa de expedientes, deixaram o seu trabalho. Outros, porém, não se dão por vencidos e querem agir até o fim, rindo-se ainda à custa dos que levam a sério.

Estas reflexões nos são como um princípio geral, e seria erro ver nelas uma aplicação qualquer. Entre os numerosos escritos publicados sobre o Espiritismo, sem dúvida alguns poderiam dar lugar a uma crítica fundada; mas não os pomos a todos na mesma linha; indicamos um meio de os apreciar e cada um fará como entender. Se ainda não empreendemos fazer-lhes um exame em nossa Revista é pelo receio de que se  equivoquem quanto ao móvel da crítica que poderíamos fazer. Assim, preferimos esperar que o Espiritismo seja melhor conhecido e, sobretudo, melhor compreendido. Então nossa opinião, apoiada em base geralmente admitida, não poderá ser suspeitada de parcialidade. O que esperamos acontece diariamente, pois vemos que em muitas circunstâncias o julgamento da opinião toma a dianteira da nossa. Assim, nos aplaudimos por nossa reserva. Empreendermos este exame, quando julgarmos oportuno o momento. Mas já se pode ver qual será a base de nossa apreciação: está não tempo a tola pretensão de lher ter o privilégio. Com efeito, a lógica é o grande critério de toda comunicação espírita, como o é de todos os trabalhos humanos. Sabemos bem o que aquele que raciocina erradamente julga ser lógico. Ele o é à sua maneira, mas só para si e não para os outros. Quando uma lógica é rigorosa como dois são quatro, e as conseqüências são deduzidas de axiomas evidentes, o bom-senso geral, mais cedo ou mais tarde faz justiça a todos esses sofismas. Cremos que as proposições seguintes tem este caráter:

1. - Os bons Espíritos não podem ensinar e inspirar senão o bem; assim, tudo o que não é rigorosamente bem não pode vir de um bom Espírito;

2. - Os Espíritos esclarecidos e verdadeiramente superiores não podem ensinar coisas absurdas; assim, toda comunicação manchada de erros manifestos ou contrários aos dados mais vulgares da ciência e da observação, só por isso atesta a inferioridade de sua origem;

3. - A superioridade de um escrito qualquer está na justeza e na profundidade das idéias e não nos enfeites e na redundância do estilo; assim, toda comunicação espírita em que há mais palavras e frases brilhantes do que pensamentos sólidos, não pode vir de um Espírito realmente superior;

4. - A ignorância não pode contrafazer o verdadeiro saber, nem o mal contrafazer o bem de maneira absoluta; assim, todo Espírito que, sob um nome venerado, diz coisas incompatíveis com o título que se dá, é responsável por fraude;

5. - É da essência de um Espírito elevado ligar-se mais ao pensamento do que à forma e à maneira, de onde se segue que a elevação do Espírito está na razão da elevação das idéias; assim, todo Espírito meticuloso nos detalhes da forma, que prescreve puerilidades, numa palavra, que liga importância aos sinais e às coisas materiais, acusa, por isso mesmo, uma pequenez de idéias, e não pode ser verdadeiramente superior;

6.- Um Espírito realmente superior não pode contradizer-se; assim, se duas comunicações contraditórias forem dadas sob um mesmo nome respeitável, uma delas necessariamente é apócrifa, e se uma for verdadeira, será aquela que em nada desmente a superioridade do Espírito cujo nome a encima.

A conseqüência a tirar destes princípios é que, fora das questões morais, só deve acolher com reservas o que vem dos Espíritos, e que, em todo caso, jamais devem ser aceitas sem exame. Daí decorre a necessidade de ter a maior circunspecção na publicação dos escritos emanados dessa fonte, sobretudo quando, pela estranheza da doutrinas que contem, ou pela incoerência das idéias, podem prestar-se ao ridículo. É preciso desconfiar da inclinação de certos Espíritos para as idéias sistemáticas e do amor-próprio que buscam espalhar. Assim, é sobretudo nas teorias científicas que precisa haver extrema prudência e guardar-se de dar precipitadamente como verdades alguns sistemas por vezes mais sedutores do que reais e que, mais cedo ou mais tarde, podem receber um desmentido oficial. Que sejam apresentados como probabilidades, se forem lógicos, e como podendo servir de base a observações ulteriores, vá; mas seria imprudência tomá-los prematuramente como artigos de fé. Diz um provérbio: "Nada mais perigoso que um amigo imprudente." Ora, é o caso dos que, no Espiritismo, se deixam levar por um zelo mais ardente que refletido.


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