sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

A hora H do Espiritismo

Após um século de propagação difícil em todo o mundo, a partir da França, sob a condenação veemente e simultânea da Ciência, da Filosofia e da Religião, o Espiritismo atinge, em nossos dias, um momento difícil. As mentiras e calúnias lançadas sobre ele criaram uma imagem falsa da Doutrina, que estranhamente predominou nos meios culturais. Até hoje, apesar da gigantesca bibliografia científica espírita existente no mundo, firmada pelos mais altos expoentes da Ciência do século passado e deste século, é comum encontrarmos homens de cultura, e inegável inteligência, que se deixam impressionar pelos seus detratores interesseiros ou ignorantes. Esses homens descem facilmente da sua posição intelectual para se colocarem ao nível das massas de fanáticos que vêem no Espiritismo a obra-prima do Anticristo e de Satanás.

A luta contra o Espiritismo é o campo do vale-tudo. Em matéria de arte, ciência, literatura ou filosofia, as pessoas têm medo de dizer ou escrever tolices, pois isso as diminuiria no conceito público. Mas, quando se trata de Espiritismo, não se pejam de empregar asneiras à vontade. Encontram, por assim dizer, a porta aberta para o desabafo. Sentem-se livres para dizer todas as tolices e asneiras que não poderiam ser ditas ou escritas em outros campos. De nada valem os nomes honrados dos grandes sábios, que são considerados simplesmente como esclerosados ou beócios, facilmente iludidos por trapaceiros vulgares. Como dizia Kardec, os sábios são sábios enquanto não tratam das questões espíritas. Mexendo nessas questões, tornam-se imbecis.

As antigas pesquisas parapsicológicas alemãs, das Ciências Psíquicas anglo-saxônicas, da Psicobiofísica, da Metapsíquica de Richet ou da Parapsicologia atual, são todas levianamente lançadas no rol da ingenuidade dos pesquisadores, ou da patifaria dos médiuns. Até mesmo os físicos e biólogos soviéticos, que tiveram a audácia de provar a existência do corpo espiritual do homem, com a expressiva designação científica de corpo bioplásmico, são reduzidas a puro engano de amadores, desqualificando-se, assim, os atrevidos investigadores. Nesse clima de asfixia da verdade, o Espiritismo devia ter morrido, mas não morreu. Pelo contrário, robusteceu-se vigorosamente pela comprovação dos seus princípios, no próprio campo materialista.

Apesar de tudo isso, e de muito mais que seria longo enumerar, o Espiritismo cresceu de tal maneira que enfrenta, hoje, situações perigosas. Como toda doutrina que se expande, está ameaçado de deturpações, revides arbitrários e desrespeitosos, adulterações, infiltrações de doutrinas estranhas e ultrapassadas. A grande propagação popular criou um campo fértil para exploração dos aventureiros, ansiosos por firmarem a sua reputação de grandes entendidos do assunto, grandes médiuns e oradores de tipo anacrônico.

Formou-se uma falsa elite cultural espírita, que se arroga o direito de reformular conceitos, revisar princípios e, até mesmo, alterar textos clássicos da bibliografia doutrinária. Atrás dos pavoneantes mestres e reformadores, formam-se as filas de candidatos ingênuos ao Reino dos Céus, que tudo aceitam de olhos
fechados e mãos postas. É a hora do perigo, em que as mais elevadas doutrinas podem ser transformadas em mistifórios grosseiros.

O trabalho real, que teria de ser feito, ninguém faz, por falta de capacidade e excesso de preguiça mental. E, quando alguém resolve iniciar alguma coisa, no desenvolvimento consciente, respeitoso, da obra fundamental de Kardec, nas bases da cultura atual, as escolinhas ou igrejinhas dos falsos iluminados se conjugam na repulsa ao trabalho cultural, em defesa da cômoda ignorância em que podem semear as suas tolices e cultivar as suas pretensões vaidosas. Vale mais, para a maioria dos adeptos, a suposta descoberta de novos métodos de passes e curas miraculosas, do que um estudo sério e esclarecedor da própria estrutura da
Doutrina e de sua posição cultural. As pessoas cultas que percebem isso temem a turba dos fanáticos e preferem resguardar o seu prestígio ao invés de lutar contra o aviltamento doutrinário. Daí o silêncio da maioria dos líderes na hora da adulteração, que rompeu a falsa aparência de unidade e coerência do movimento espírita brasileiro.

As obras de assistência social atraem as contribuições generosas, em prejuízo das obras culturais. A ajuda ao próximo só é interpretada em sentido material. A cultura perece e os charlatães se divertem deslumbrando os basbaques. ninguém se lembra de que estamos numa fase de grande desenvolvimento cultural, favorável
ao entrosamento da cultura espírita. A penúria intelectual do movimento espírita contrasta estranhamente com as dimensões conceptuais e as finalidades da Doutrina, a única que oferece a possibilidade de soluções evangélicas para a situação mundial.

Vaidade das vaidades, tudo é vaidade, diz o Eclesiastes. Até mesmo pessoas analfabetas, quando aprendem a lidar grosseiramente com a mediunidade, julgam-se mestres infalíveis. E, criaturas dotadas de diplomas universitários tornam-se seguidores de messias broncos, profetas incultos, que usam sem temor o atrevimento da ignorância para atacar e criticar os que lutam em defesa da Doutrina. Como modificar essa situação desastrosa sem a abnegação de pessoas que, dotadas realmente de formação cultural (e não apenas de diploma), se ponham corajosamente em campo? Esta é a Hora H do Espiritismo. Ou ele se firmará como
um processo cultural legítimo, ou será asfixiado pela avalancha de sandices que sobre ele despejam, sem cessar, os pretensiosos irresponsáveis, missionários por conta própria, elaboradores de doutrinas individuais e ridículas, sugeridas pelas mentes sombrias que desejam ridicularizar a Doutrina.

Os que se omitem por comodismo e interesses subalternos, nesta hora decisiva, cantando louvores a todos os absurdos em nome da tolerância e da fraternidade (como se essas duas palavras significassem conivência), são piores que os semeadores de joio, pois são os que estimulam e sustentam o trabalho de sapa no meio doutrinário. A eles podemos aplicar a advertência do Cristo aos fariseus, pois os ladrões e as meretrizes chegarão, antes deles, ao Reino dos Céus.

O Mistério do Bem e do Mal, J. Herculano Pires

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